..:: Abade R. Fatia ::..

e tantas vezes aqui deitado a olhar para o tecto, à espera. Sempre à espera... oiço passados, faço planos envenenado em pensamento, vejo luzes, como árvores, penso em ti, sinto-me alguém na minha cama. A mente é um lugar aleatório

segunda-feira, dezembro 31, 2007

Flanqueando-os

Entornou os anjos amolgados
Içando nylons de asas desfeitas
Num agoiro refilante de cores
De céu desocupado por eles todos.

Aquele tear de beijos esquecidos,
Fogaça em algodão prateado,
Era um modelo de alças esventrado
Mordendo o chão, cinzento de enfado.

Dos seus caninos - azedos cristais -
Levitando articulações quebradas
Saem finórios morcegos buçais
Que bebericam as chuvas mansardas.

A Moita

Reflexo em espelhos diurnos
De uma jóvem moita que amanhece
Estende os troncos de sol e acontece
Que oculta dois amantes nocturnos.

Na serena fábrica palpitante
Daqueles fetos-por-vir
E o gemido lancinante
Das agulhas masturbatórias de sentir.

O Cortador de Lenha

Era Gresso, um pobre Gresso
Acordava pelas seis da matina
Bebia o seu expresso
Tinha nome de margarina.

Amava que era um Fastio
E andava cheio de Vigor
O seu amigo mais verdadeiro
Era também um bom Vaqueiro.

Um dia foi à loja do Tó Chiba
Comprar o pente e um
Trocadilho para pôr aqui.

Majorette

Majorette se me amas

O Desflorador

Santos metatásticos com certeza!
Habitam-me por dentro roçando-se
Num tumor de ideias.
Estou prenho! Meu Deus estou prenho!
Acudam-me que vai nascer
E vai berrar! E VAI BERRAR!
O meu gâmbito espontâneo.

Ele, Que Asma Ser


Ele, que asma ser, abtráctil, feudal,
A vós, que entopem, destros e escaldos,
Almeja dar-vos, leves, bastardos
Uma dormência funesta, sem jornal.

Guisado sem regra no assaz terraço.
Por sandalar-vos, sem nó, lacros e lérios.
Que sois epicentros antigos e sérios,
Descalçou-se de réu, fumou-se de laço.


(depois cansado e livre
porque de nada lhe servira...)


Não sei que mais: de aqui para outro nível
Distante.
Forma-se-me um nó na garganta.
Não distanto de saber aquele outro.
Pois nivelei lá, mais do que aqui
Sempre em forma de outrar,
Formando gargantas a outrém
Num desapego à distância
Sempre aqui, sempre além.

Éóó-éóó! Éóó-éóó!
Se pensares bem
Éóó-éóó!! Se vires bem.
Mendigos de mim.
Éó.
Não vos desapontando, desaponto-me.

Mas afinal de contas de quem é a MINHA custódia?
Mas mas
De contas afinal de
Quem é a
MINHA de contas afinal
Custódia de
Afinal quem é
A MINHA de contas afinal
Custódia de a final
É de a
Final de
Com
Tasde a fi
Nalmi

Plebeu!
Só me resta dizer plebeu.

sábado, dezembro 29, 2007

Bem Bom


Uma da manhã, hey
Bem bom duas da manhã
Bem bom já três da manhã, hey
Bem bom quatro da manhã

Bem bom cinco da manhã, hey
Bem bom já seis da manhã
Bem bom sete da manhã, hey
Bem bom oito da manhã
Bem bom café da manhã para dois
Sem saber o que virá depois
Bem bom

Duas da manhã, hey
Bem bom sete da manhã
Bem bom já nove da manhã, hey
Bem bom quatro da manhã

Bem bom uma da manhã, hey
Bem bom já seis da manhã
Bem bom vinte da manhã, hey
Bem bom doze da manhã
Bem bom café da manhã para dois
Sem saber o que virá depois
Bem bom

Quatrocentas da manhã, hey
Bem bom trinta da manhã
Bem bom já vinte três da manhã, hey
Bem bom quinhentas e cinquenta da manhã

Bem bom nove mil seiscentas e onze da manhã, hey
Bem bom já quarenta e duas da manhã
Bem bom vinte e cinco da manhã, hey
Bem bom duzentas da manhã
Bem bom café da manhã para dois
Sem saber o que virá depois
Bem bom

Quarenta milhões da manhã, hey
Bem bom oito mil da manhã
Bem bom já noventa e seis e picos da manhã, hey
Bem bom zero da manhã

Oitocentas e setenta e sete da manhã, hey
Bem bom milhão e meio da manhã
Bem bom já dezenas da manhã, hey
Bem bom meia dúzia da manhã

Dez p'rás cinco da manhã, hey
Bem bom tantas e meia da manhã
Bem bom já vinte e sete menos cinco da manhã, hey
Bem bom dezanove e tal e tal da manhã

Bem bom três ou quatro da manhã, hey
Bem bom já perdi a conta da manhã
Bem bom faltam tantas para picos da manhã, hey
Bem bom meia arroba da manhã
Bem bom um quarteirão da manhã para dois
Sem saber o que virá depois
Bem bom

Dez biliões trezentas e quarenta e sete da manhã, hey
Bem bom duas mil novecentas e trinta e oito da manhã
Bem bom já cinquenta moles da manhã, hey
Bem bom cinco hectares da manhã

Bem bom trinta metros da manhã, hey
Bem bom já três terços da manhã
Bem bom dezassete dezoito avos da manhã, hey
Bem bom infinitas da manhã
Bem bom café da manhã para dois
Sem saber o que virá depois
Bem bom

domingo, dezembro 23, 2007

Canto de Rua

O que é isto? Que me faz pensar e ser assim? O que está por trás disto que eu sou? E me faz assim, repleto de sonhos e fobias. O que me faz menos genial que os grandes génios da história, o que me faz querer ser como eles. O que me faz querer ser maior que eles. O que me deprime por pensar que não lhes chego aos calcanhares. O que me deixa inseguro no amor. O que me torna hipersensivel à morte, à saudade e à música. O que me impede de compreender a música. O que me pensa brilhante e me faz mediocre.
Por momentos deixo toda a negatividade tomar conta de mim. Desce-me do cérebro e ocupa-me os olhos e a boca. Transforma-me as feições e fico feio. Isto que me permite ouvir a música e ficar só a sentir(-me). Sentir o universo infinito, sentir as dúvidas que me assolam. Sentir a aura dos outros, dos que foram grandes. Para quê esta sede de grandeza? Eu admiro tanto a simplicidade. Eu que gostava tanto de ser simples e ao mesmo tempo complexo. Eu que vejo virtudes em ambos e em todo o lado e em todas as coisas. O que sou eu que não me defino?
Um observador? Que bonitos são os observadores! Que falam das pessoas e dos acontecimentos com aquela distância lúcida. Analisam os prós e os contras de cada gesto. Que sabem situar esse gesto no seu contexto socio-cultural, compreendê-lo e atribuir-lhe mérito (proponho aqui um novo verbo à lingua portuguesa: “meritar”) e acima de tudo sabê-lo relativizar e opinar sobre alternativas melhores.
Mas que papel activo tomam na sociedade os observadores da sociedade? Eu queria tanto ter um papel vincado. Que muita gente falasse (maioritariamente bem) das minhas escolhas na vida, das minhas frases proferidas enquadradas nos melhores contextos. Como poderei eu ser personagem disto com papel activo e ainda assim esperar lucidez dos meus actos e ditos? Um “actor” diz o que lhe vai na alma, independentemente do credo da sociedade. Esse “actor” encarna um papel, uma filosofia e é coerente consigo. Essa filosofia terá certamente consequencias negativas (defeitos) nesta ou noutra sociedade, mas é o seu papel, e ele leva-o ao extremo. E é, por isso, a personagem de que todos se lembram e com quem todos podem contar naquele âmbito de coerência.
Coerência. Principalmente coerência.
Eu quero ser razoável. Aliás: eu quero ser admirado. Quer por mim, quer por uma minoria a que eu chamo de intelectualidade. Talvez por presunção minha, mas sobretudo (e na minha maior honestidade) porque alcanço exactamente o que se passa nesse contexto.

(lost context)

Aquela noite na “maré”. Um cigarro e uma barraca de madeira e lã em cima do mar, e barcos, muitos barcos. Quanta poética há nos barcos e que eu ignorei naquele momento, onde os meus melhores amigos e um cigarro me preenchiam a vida?
Zunzuns incertos.
Um papel na sociedade, na forma como eu o compreendo, consiste em dizer/fazer isto ou aquilo, certo ou errado, com a maior convicção. E conseguir convencer os mais fracos - ou a elite que compreende – acerca da veracidade/crueza/poética/consistência das suas palavras/acções. Ponto final.
Mais. Há mais para além de mim.
Ainda tenho um amor extraordinário por ti – Anabelle Lee. Ainda hoje, que já te não vejo (e começo a escrever assim) há mais de dois meses.
Hoje vi e revi fotografias tuas. Há qualquer coisa no teu olhar que coincide com o meu. É o olhar que tenho quando sei exactamente o que sou e o que quero, e é o olhar lúcido dos que são como eu e pertecem ao meu universo - do qual tu fazes parte certamente. Do qual eu às vezes me parece que não faça parte por desvios meus, ou que tu não faças parte por insegurança minha.
É neste momento, cheio de sinceridade frieza e lucidez, amor o que sinto por ti.
Eu amo o que tu és.

terça-feira, dezembro 04, 2007

fotografia

Observaram alguma vez no Inverno, do alto de uma ponte, os caprichos do flutuar dos gelos num grande rio? Correm, entrechocam-se, mergulham, tornam a subir, desviam-se do seu caminho, vão para a direita, vão para a esquerda; depois, num momento, sem se saber porquê, agrupam-se de repente, agarram-se, as figuras da sua contradança fluvial detêm-se, forma-se um chão majestoso sobre o qual um menino salta com os pés nus, ousadamente, e corre de uma ponta a outra.

Honoré de Balzac - Aventuras Administrativas de uma Ideia Feliz