A uma moeda
Fria e tempestuosa a noite em que zarpei de Montevideu.
Ao dobrar o Cerro,
atirei do mais alto convés
uma moeda que brilhou e se afogou nas águas barrentas,
uma coisa de luz arrebatada pelo vento e pela treva.
Tive a sensação de ter cometido um acto irrevogável,
de acrescentar à história do planeta
duas séries incessantes, paralelas, talvez infinitas:
o meu destino, feito de soçobro, de amor e de vãs vicissitudes
e o daquele disco de metal
que as águas dariam ao suave abismo
ou aos remotos mares que ainda trituram
despojos dos saxões e dos viquingues.
A cada instante do meu sonho ou da minha vigília
corresponde outro da cega moeda.
Por vezes senti remorsos
e outras vezes inveja
de ti, que estás, como nós, no tempo e no seu labirinto
e que não sabes isso.
Jorge Luís Borges
1 Comments:
At 11:31 da tarde,
The Love Coach said…
Excelente sensibilidade caro Abade :)
Um abraço,
The Love Coach
http://sermacho.blogspot.com
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